sexta-feira, 16 de novembro de 2007

SSP está acima da lei

A Polícia goiana, em especial a Militar (agora uma superintendência da Secretaria de Segurança Pública), definitivamente parece estar confundindo autoridade legal com autoritarismo. Levantamento do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, comandado pelo ministro Paulo Vannuchi, tem listado 18 casos sobre assassinatos e desaparecimentos atribuídos a policiais militares de Goiás, nos últimos seis anos e meio. A situação será denunciada à ONU. Isto, porém, aparentemente não abala o titular da SSP goiana, o criminalista Ernesto Roller, que com sua pose de galã e sorriso fácil se mostra mais propenso a desdenhar da situação. "Não há evidências de morosidade nas buscas pelas autorias. A corregedoria tem tudo sobre controle". Resta-nos apenas indagar 'controle de quem?'.
O escárnio à situação é de tal dimensão que chega a causar medo, pois ao contrário do que possa parecer, a cada suposto criminoso que se mata, outros protagonistas da marginalidade surgem e se estabelecem com maior ferocidade. Recentemente me indagaram dos motivos que guindaram o ex-secretário José Paulo às graças dos policiais. Arrisquei a responder que o planejamento estratégico implementado nas açaões, aportados por uma signficativa melhora logística. Ouvi risos, para em seguida ser 'informada' que a melhora salarial significativa o teria intronizado ao reino dos eleitos. Em considerar esta linha de raciocínio como correta, seria então plausível sustentar que o atual secretário para se manter na redoma da admiração dos comandados estaria fazendo vistas grossas à faxina justiceira.
Afinal de contas é inadmissível que uma chacina nos moldes do bar califórnia não se tenha sequer indícios de autoria. É brincadeira! A Delegacia de Homícidios sustenta que é difícil represar esse tipo de crime, mas volta e meia consegue devendar autorias quando se trata de vítimas com uma certa posição social e cujos algozes não pertençam aos quadros dos que deveriam defender a sociedade.
Esta situação me remete aos idos dos anos 80, quando um certo delegado, travestido de Eliot Ness (personagem inspirado na vida real do policial que atuava na Chicago do início dos anos 30 para coibir o poderio da máfia e fazer valer a lei seca), mas às avessas, resolveu editar os ‘garotos de ouro do Médici’ e varrer Goiânia da presença de supostos bandidos [digo supostos por que nenhum foi julgado com base na lei vigente no Brasil]. Era a turma do UVA – União das Vítima de Assaltos.
A todo instante surgiam partes de corpos nas portas de vítimas, jornalistas e até do Palácio das Esmeradas, com a devida assinatura: um cacho de uva. Era o escárnio do escárnio. Aproveitaram a lenda urbana de que um braço da Scuderie Le Cocq (homenagem a Nilton le Cocq, lendário detetive carioca em ação nos anos 60; muito mais que uma escuderia, o grupo montou uma entidade paramilitar, com ritos medievais de iniciação, uniformes e o indefectível capuz negro para ações armadas; nessa estranha confraria, os membros tratam-se por ‘irmãozinho’ e difundem a idéia de que proteção mútua é questão de vida ou morte; adotam uma caveira como símbolo, apoiada em duas tíbias cruzadas sobre as quais lêem-se as iniciais EM - clara alusão ao Esquadrão da Morte, terror nos anos 70; a escuderia Le Cocq, segundo conclusões da Polícia Federal, é mantida, até os dias de hoje, com contribuições empresariais capixabas) havia se transferido para Goiânia, como forma de se valorizarem.
Na minha avaliação nunca passaram de bandidos. Aliás, piores do que aqueles que julgavam estar livrando a sociedade, pois ao matar, esses agentes públicos corrompidos acabavam por assumir as atividades ilegais bancadas pelos exterminados. Era um caos. Os anos se passaram, e paulatinamente, eles foram sendo aposentados. O que se percebe, agora, é que o grande volume financeiro gerado pelo tráfico e golpes pela internet têm aguçado o instinto assassino de alguns da tropa policial.
Muitos cidadãos podem até não conter os aplausos a esse lado submerso da cidade, onde impera uma sinistra teia de poder que se enrosca em setores do aparelho estatal e contamina o discernimento. Hoje se é consentido matar, sem julgamento, os que se colocam à margem das leis vigentes, amanhã os mortos podem estar em nossas salas e não teremos para quem reclamar ou clamar por respeito às leis. E a história está repleta de situações como estas. Não sou contra que a polícia se faça autoridade legal e se valha de instrumentos previstos na Constituição e nas leis vigentes para estabelecer a ordem. Mas atribuir a si própria o poder de Judiciário é pegar senha para uma sociedade esfacelada. É dizer olá para a SS.

Postado por Carla Monteiro

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